O dia seguinte da eleição na Venezuela não trouxe grandes surpresas. Conforme destacou a análise da redação da Vírgula, em 29 de julho, “é nesse contexto que ocorre a decisiva aproximação da Venezuela com a Rússia, a China e o Irã, sinalizando para o Ocidente a nova orientação geopolítica do país que, ao lado de Cuba, sofre sanções e embargos”.
Em 2007, publiquei um artigo acadêmico no ‘Observatorio Iberoamericano del Desarrollo Local y la Economía Social’, revista editada pela Universidade de Málaga, sobre os dilemas do desenvolvimento na América Latina. Naquele tempo, minha preocupação girava em torno do personalismo hispano-americano, que, por sua vez, se apresentava, no meu entendimento, como parte do imbróglio geopolítico regional para o Brasil.
Polarizações ideológicas já eram vistas como inevitáveis em sociedades muito desiguais. Afinal, estariam essas sociedades reféns de repetir as suas próprias histórias como tragédia e farsa? Questões complexas não podem ser resolvidas a partir da importação de instituições, incluindo normas de convívio social e formas de pensamento dos países mais desenvolvidos.
O avanço de um neoliberalismo tosco e radical tampouco foi capaz de atenuar as graves desigualdades socioeconômicas na região. Do ponto de vista das semelhanças das crises na América Latina, destaquei então que “nos próprios ciclos de euforia, a elasticidade-renda da demanda construía as condições do estrangulamento das contas externas. Ao elevar-se a renda média da população, a busca por produtos mais sofisticados aumentava”.
Em síntese, como centros cíclicos do sistema econômico global, os países mais desenvolvidos difundem padrões de consumo pelas vias do progresso técnico endógeno. Incompatíveis com as realidades de consumo da periferia do sistema, os países mais pobres vivem ciclicamente processos inflacionários, endividamento do Estado e crises cambiais. Quando se inclui uma alta taxa de informalidade na economia e a precarização das relações laborais, o quadro estrutural do subdesenvolvimento fica mais completo.
A Venezuela possui um ingrediente complicador na nossa região, algo que a literatura científica chama de “a maldição dos recursos naturais”. Destaco, nesse sentido, o diagnóstico de Celso Furtado, feito em 1957. Segundo ponderou o professor, “as etapas de rápido crescimento com base em estímulos externos, quando não produzem mudanças estruturais do sistema econômico, tendem necessariamente a um ponto de estagnação”.
Em um quadro estrutural de subdesenvolvimento, a elevação do coeficiente de importação aumenta a dependência do setor exportador e amplia a vulnerabilidade externa da economia. Conforme afirmou Furtado, “a expansão do setor petroleiro foi condição necessária, mas não suficiente para que se desenvolvessem os demais setores”. Desde a década de 1960, golpes de Estado e retrocessos amparados pelo neoliberalismo oligárquico não resolveram os problemas estruturais da América Latina.