Ainda estamos testemunhando a dramática situação no Rio Grande Sul, sem saber quando algo do gênero poderá se repetir, guardadas as devidas proporções, em outras unidades federativas brasileiras. Nos estados do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, por exemplo, são recorrentes os problemas de alagamentos e prejuízos provocados por fortes chuvas.
Nesse sentido, o artigo do colunista Bernardo Mello Franco, publicado no jornal O Globo, em 8 de maio, é capaz de provocar reflexões necessárias. Em síntese, o jornalista defende que “é preciso, sim, politizar a tragédia climática”. Afinal, enfatiza Mello Franco, “escolhas políticas estão na origem da emergência climática”.
Restam poucas dúvidas de que o negacionismo climático precisa ser combatido, pois, segundo o jornalista, “governantes que não investem em prevenção contribuem para ampliar os desastres”. A atual gestão da cidade de Porto Alegre é citada no artigo como um exemplo a não ser seguido.
Em relação ao governador gaúcho, Mello Franco mostrou que ele “patrocinou o desmonte da legislação ambiental do estado”. O jornalista completou dizendo que, “aprovadas em 2019, as mudanças afrouxaram as regras de licenciamento, liberaram o corte de árvores nativas, reduziram a proteção de rios e nascentes”.
Neste ano de 2024, o governador gaúcho, acrescentou o jornalista, “sancionou outra lei que permitiu a construção de barragens para o agronegócio em áreas de proteção permanente”. Não se trata de uma obra isolada, de acordo com Mello Franco, porque “o descaso com os riscos climáticos se estende à bancada federal do Rio Grande do Sul”.
Em entrevista à emissora alemã DW, no dia 7 de maio, o climatologista Carlos Nobre tratou do desafio de preparar as cidades brasileiras para os eventos climáticos extremos. Ele estimou que três milhões de pessoas teriam que ser retiradas de áreas de risco. “Aumentar a resiliência e ter uma política de adaptação às mudanças climáticas é um investimento de centenas de bilhões de reais”, afirmou o cientista.
O momento requer coesão nacional para a organização de ações que reduzam o sofrimento no Rio Grande do Sul. No entanto, reconheceu Mello Franco, “medidas emergenciais não evitarão novos eventos extremos”. A saída passa pela elevação da qualidade da política brasileira, afinal, projetos que prestigiam ações de desproteção ambiental tramitam no Congresso Nacional.
Saberemos, como sociedade, tirar lições valiosas da catástrofe no Rio Grande do Sul? Haverá mudanças de mentalidades na política e na condução de negócios? Ciclos extrativistas predatórios marcaram o processo de colonização do nosso território. Segundo Darcy Ribeiro, no livro ‘O povo brasileiro’ (1995), a metáfora dos “moinhos de gastar gente” se aplica muito bem ao nosso processo histórico.
Devemos reconhecer que estamos enfrentando, em escala planetária e com repercussões regionais distintas, o risco existencial provocado pela emergência climática. Para quem tiver um maior interesse no assunto, recomendo o livro “O decênio decisivo”, do professor Luiz Marques, editado pela Elefante, em 2023. Está mais do que na hora de fundarmos uma sociedade protetora do ser humano.