O Brasil está embarcando em uma nova e ousada fase em sua busca por soberania digital, com o recente lançamento do Plano Nacional de Inteligência Artificial. Esse plano, impulsionado pelo governo Lula, destina R$ 1,1 bilhão para o desenvolvimento de um Grande Modelo de Linguagem (LLM) nacional, a tecnologia central por trás de chatbots como o Chat GPT. A diferença crucial aqui é que esse LLM será treinado com dados nacionais, compreendendo o português como sua primeira língua, em um prazo ambicioso de apenas 12 meses.
Essa iniciativa não é isolada, mas parte de um esforço maior para ampliar a soberania digital do país. Junto ao supercomputador de ponta e à chamada “nuvem soberana” (soberana no sentido de ser nacional, criada pelo Estado Brasileiro), a criação de um LLM brasileiro busca a independência tecnológica e o domínio sobre as vastas quantidades de dados que o país produz. O governo tem sido claro em seu objetivo: embora haja uma abertura para a participação de grandes empresas multinacionais, a colaboração só ocorrerá mediante a transferência de tecnologia, garantindo que o Brasil detenha o controle e o conhecimento sobre essa inovação crucial.
E por que esse é um bom negócio? Bem… os dados são a matéria prima para treinar inteligências artificiais pelo mundo. Por sua vez, esses dados são criados o tempo todo a partir da nossa existência (dados sobre localização, preferências de consumo, sites e produtos buscados, compras feitas, câmeras de trânsito, digitais, reconhecimento facial nos prédios comerciais…. a lista poderia seguir indefinidamente), que são capturados pelas empresas que criam os programas de inteligência artificial, monetizando-os posteriormente.
A extração dos dados, enquanto primeira etapa desse ciclo, é a parte mais importante. Não é à toa que os dados são chamados de “o novo petróleo”. E nós os estamos dando gratuitamente para um sem-número de aplicações.
Uma tecnologia nacional, que é treinada a partir dos dados nacionais, além de produzir um produto informático brasileiro, é capaz de refletir em um programa de inteligência artificial mais adequado para as nossas particularidades e que solucione problemas únicos da nossa realidade.
Além disso, o aspecto de soberania digital é central nesse contexto. O Brasil, como uma das maiores economias do mundo, reconhece esse valor estratégico dos dados que gera. O objetivo é que o país possa competir no cenário global de tecnologia, sem renunciar a seus recursos mais valiosos.
A criação de um chatbot nacional baseado em um LLM brasileiro representa muito mais do que uma inovação tecnológica. Em uma era em que a tecnologia é predominantemente dominada pelo setor privado estrangeiro – e essa atividade não é suficientemente regulada ante a sua novidade – a criação em solo nacional é uma afirmação de independência, uma proteção dos dados e dos direitos dos cidadãos, e uma demonstração de que o Brasil está disposto a liderar com responsabilidade no campo da inteligência artificial. Esse projeto, se bem-sucedido, poderá reforçar a posição do Brasil como um dos líderes em tecnologia na América Latina e no mundo, servindo como um modelo para outras nações que desejam equilibrar inovação com soberania e ética.
Neste cenário, nos colocamos não somente como consumidores passivos de tecnologias desenvolvidas em outros países, mas como um criador e um guardião de sua própria narrativa tecnológica. Ao adotar uma abordagem que valoriza tanto a inovação quanto a proteção dos dados, o país poderá construir uma inteligência artificial que respeite suas próprias normas culturais e éticas, definindo um novo padrão para o desenvolvimento global.
Entretanto, é fundamental que, ao desenvolvermos essas tecnologias, mantenhamos um olhar crítico sobre seu uso e impacto na sociedade. A inovação tecnológica deve ser orientada por princípios éticos que priorizem o bem-estar coletivo, assegurando que a inteligência artificial seja uma ferramenta para o progresso social, e não apenas um produto de mercado. O futuro da soberania digital brasileira depende da nossa capacidade de garantir que essa tecnologia esteja a serviço da população, protegendo seus direitos e promovendo a inclusão e a justiça social.