A psicanálise estuda os padrões. Em um processo de gestão de crise também se estudam os padrões. Eles são fundamentais para se identificar como nascem as crises de imagem e como manejá-las.
Um dos padrões psicanalíticos que assombram este mundo moderno, pautado nas imagens produzidas pelas redes sociais, é a comparação. Há vinte anos, nossa prática nos induzia a nos comparar a pessoas próximas, do nosso convívio, que levavam um estilo de vida, fluência intelectual ou característica sexual que de alguma maneira nos atraía. Hoje, o ato de comparar perdeu suas fronteiras e passamos a nos medir, também, com uma régua global: alguém, do outro lado do mundo e que sequer conhecemos, serve de inspiração sobre quem deveríamos ser.
A comparação, de certo, é inadequada, embora muitas vezes inevitável, afinal cada pessoa tem uma vida única, com diferentes oportunidades e ambientes. Os contextos importam e podem levar a comparações extremamente injustas, resultando em sofrimento.
Toda essa hermenêutica me faz lembrar ‘O Mito da Caverna’, texto que compõe a mais famosa obra de Platão, ‘A República’. Este mito descreve prisioneiros acorrentados em uma caverna, observando sombras projetadas na parede e acreditando que aquilo é a realidade. Até descobrirem que a verdade é sempre relativa e a realidade nem sempre é o que enxergamos debaixo do nosso nariz.
Hoje, as pessoas se comparam com fragmentos de vida meticulosamente escolhidos e compartilhados por outros nas redes sociais. É essencial olhar além da sombra, é necessário reconhecer que o que você vê nos stories do Instagram, por exemplo, não representa nem 1% da realidade da vida daquela pessoa, que exibe ali o que escolhe mostrar.
Sair da caverna significa ver a sombra, ou o fragmento, pelo que realmente é: apenas um recorte, entendendo que aquilo não representa a realidade.
A política offline é um pouco diferente da que o cidadão-internauta percebe online. Na rede, os atores políticos se mostram como desejam ser percebidos; nos palcos, por detrás das tribunas e nas ruas, a projeção também existe. O bastidor é um outro ambiente, muito mais desafiador e por deveras vezes bagunçado, desajeitado; a coxia tem conversas que a plateia não ouve.
Por isso é importante (e, nestes tempos, imprescindível) enxergar para além do que as pequenas e grandes telas mostram, os belos sorrisos sugerem e a gritaria estridente anuncia.
No piloto automático das redes sociais, deslizando feeds, olhar para a sombra na caverna e pensar que aquilo é a realidade é temerário. Estamos em um ano eleitoral, e as imagens podem ser apenas sombras irreais de gente muito real.