A pesquisa Genial/Quaest divulgada no dia 6 de março de 2024 precisa ser analisada e discutida com atenção, tanto pelo governo Lula (PT), quanto pelos setores que integram o campo progressista e democrático. Seus resultados não são nada bons para ambos, entrelaçados numa grande frente política desde o processo eleitoral de 2022. Há nesses resultados uma fotografia preocupante, que aponta para a existência de um fosso entre as ações de governo e o imaginário progressista e democrático da realidade concreta do país.
Passados 15 meses do início do terceiro governo Lula, que só se materializou com a montagem dessa ampla frente política, o país permanece dividido pela emoção, pelos sentimentos de adesão a campos antagônicos, caracterizando um cenário de polarização cada vez mais cristalizada, portanto, refratária à razão.
Apesar da aprovação do Presidente Lula estar na faixa dos 51% do conjunto dos entrevistados, ela caiu em relação à pesquisa anterior. Desse total, 58% se dizem católicos e 35% evangélicos. Já entre os 49% que desaprovam, 39% se dizem católicos e 62% evangélicos.
Segundo o cientista político Felipe Nunes, diretor do Instituto Quaest, “nenhuma diferença entre aprovação/desaprovação é tão significativa quanto a observada no eleitorado evangélico”. No campo da economia, 38% dos entrevistados dizem que houve melhora nos últimos 12 meses, contra 26% que afirmam haver tido uma piora e 34% para quem tudo continua do mesmo jeito.
Segundo Nunes, “é a primeira vez que cai a avaliação positiva da economia entre os eleitores do Lula”. Na pesquisa anterior, 55% desses eleitores opinaram que havia tido melhora na economia, contra os 46% da pesquisa de 6 de março. Uma queda de 9%. No mesmo universo de eleitores do presidente, 15% deles acham que houve piora na economia, contra 11% da pesquisa anterior, uma queda de 4%. Há uma percepção generalizada de alta dos preços das contas, 63%, dos combustíveis, 51%, e dos alimentos, 73%.
São dados preocupantes, ainda que o governo goze de uma boa avaliação especialmente se comparado a outros de diferentes países. Mas nos detalhes moram os grandes perigos, como a percepção da alta dos preços e na oposição do eleitorado evangélico, que se mantém firme como em 2022. No campo econômico, são notórias as melhorias, razão pela qual preocupa que as mesmas não estejam sendo sentidas pela população em níveis mais altos.
O governo Lula não conseguiu, ao menos até o momento, estabelecer com a população brasileira canais consistentes de comunicação. Não consegue, por exemplo, expor ao Brasil o que está planejando, o que vem fazendo e entregando em termos de obras, melhorias dos serviços públicos, avanços na área da economia – seja na área financeira, na fiscal – e nos investimentos no setor produtivo, inclusive no agronegócio. A percepção de que a economia vai mal, como demonstrado nos aspectos abordados pela pesquisa, é um sintoma de mal-estar que, se não enfrentado logo e com competência, pode evoluir para o nível de doença grave.
Onde estariam as falhas? Por óbvio que na opção política de se fazer uma comunicação competente, mas arcaica, de contar com o engajamento da sociedade civil, como se essa ainda se organizasse de forma vibrante em sindicatos e associações, na inexistência de conhecimento da gramática das redes sociais e de todo o seu ecossistema, na não inserção competente nesse ecossistema das novas mídias – uma dificuldade do campo progressista e democrático em todos os países -, e na visão messiânica de que a pessoa do presidente Lula, e somente ela, pode dar conta de responder a todos os desafios de uma comunicação eficaz nos tempos atuais.
Um cálculo errôneo, cujos resultados vão sendo colhidos a cada pesquisa divulgada. Um resultado negativo, que ainda pode ser corrigido, desde que haja clareza e vontade para tanto.
O falecido Deputado Ulysses Guimarães dizia que “não lutava contra os fatos”. E isso é certo, pois não se pode negar uma realidade, e sim interagir com os elementos que a constituem no sentido de sua reversão a partir de ações concretas. Fazer chegar ao povo brasileiro, de todos os credos e gêneros e todas as matizes ideológicas, o que de fato o governo vem fazendo em prol da transformação da vida de todos é uma questão que vai se impondo como mortal para o jogo político e para a preservação e aprimoramento da Democracia e do Estado Democrático de Direito.