A atual vice-presidenta dos Estados Unidos, Kamala Harris, já supera o ex-presidente Donald Trump em Estados cruciais para a vitória eleitoral nas eleições de novembro. Trump, pelo Partido Republicano, e Harris, pelo Democrata, devem se enfrentar nas eleições presidenciais de novembro. A candidatura de Harris sequer foi homologada pelo seu partido, mas vem recebendo, desde o dia 21 de julho, apoios de todas as correntes democratas para substituir o atual presidente, que desistiu de disputar a reeleição, e indicou sua vice como sua preferência para a disputa.
Os democratas, até o dia 21, amargaram o sabor de uma derrota provável de Biden em novembro, como sinalizavam a maioria das pesquisas eleitorais. Alvo de inúmeras críticas, Biden não entusiasmava a base tradicional do Partido Democrata – negros, mulheres, jovens, hispânicos e progressistas, a sair de casa para votar, ou a se engajar na campanha, inscrevendo eleitores e convencendo-os a participar do pleito.
Nos Estados Unidos, o voto é facultativo, e a forma de votação varia de Estado para Estado e, mesmo, de Condado para Condado, em razão da confecção das listas de eleitores aptos a votar nos diversos centros eleitorais. A participação desses setores foi essencial para as duas vitórias de Barack Obama (2008 e 2012) e na de Joe Biden (2020), quando mobilizaram uma massa de estadunidenses a se engajar no processo eleitoral e decidir o pleito. A vitória de Biden sobre Trump há quatro anos, quando este buscava sua reeleição, foi fruto desse esforço de mobilização, e do temor existente em diversos setores sociais sobre os projetos autocráticos do ex-presidente e novamente candidato neste ano.
Como a eleição presidencial dos Estados Unidos é indireta, são delegados por Estados, escolhidos em razão da votação dos candidatos nas 50 Unidades da Federação, quem escolhem o Presidente e o seu Vice, em uma reunião do Colégio Eleitoral. Há estados com tradições de voto nos Democratas , como é o caso de Nova York e Califórnia, e nos Republicanos, como Texas e Kansas, e há aqueles que balançam – swing states, podendo pender para um dos dois partidos, conforme a campanha e as emoções que a mesma despertem. É sobre esses Estados que os partidos concentram seus maiores esforços, tentando fazer com balancem em sua direção. Entretanto, em 2020, Estados tidos como Republicanos, como a Georgia, foram tomados por esses grupos que integram a base tradicional do Partido Democrata, levando não apenas à vitória de Biden e a conquista dos delegados do Estado no Colégio Eleitoral, como, também, a eleição dos dois senadores cujas vagas estavam em disputa naquele pleito.
O caminho para uma candidatura forte de Kamala Harris está sendo pavimentado pelo seu partido, e pelas vultosas contribuições financeiras dos doadores, que vem aumentando a cada dia. Após vencidas as rusgas iniciais, inclusive do casal Obama, Harris desponta como a favorita para ser consagrada candidata na convenção e enfrentar um Donald Trump que, até algumas semanas atrás, aparentava ser imbatível contra um Joe Biden bastante enfraquecido.
Mas veio a desistência do dia 21, e todo o clima favorável a Trump, que saía da apoteose da convenção republicana, ocorrida em meados de julho, dias após um atentado contra o candidato, fortalecido para o embate contra um adversário que estava sendo considerado fraco e incapaz de exercer, por mais quatro anos, o governo dos Estados Unidos. Mas a roda da história gira, e tudo começou a mudar a partir da noite do dia 21 de julho.
Temos hoje, conforme dados da pesquisa Bloomberg/Morning Consult, divulgada no dia 31 de julho, antes da oficialização de Kamala Harris como candidata democrata, ela já ultrapassa Trump, ainda que dentro da margem de erro, em alguns estados-chaves, swing states. Esse dado é extremamente importante para a democrata, e super preocupante para o republicano, pois reverte todo o cenário de expectativas existentes antes da decisão de Biden de renunciar à reeleição, ocorrido no dia 21. A campanha será longa, e bastante disputada até o pleito de novembro, pois se trata da eleição para a presidência da mais importante nação do norte global, do império, ainda que vivendo um momento de forte declínio e contestação de seu poder militar e econômico. Harris e Trump tem pela frente um longo caminho a percorrer no convencimento do eleitorado.
Ganhará a candidatura que animar os Estados Unidos e o seu povo na (re)construção das condições de emprego, de melhoria de renda e de vida digna para a maioria. O país está mais pobre, desindustrializado, sua moeda já é questionada como o padrão do comércio internacional e encontra-se enfraquecido nas disputas geopolíticas internacionais. Ao mesmo tempo, como na Venezuela, há uma divisão interna polarizada dos campos políticos das mais perigosas, alimentada pelo discurso de ódio muito centralizado na extrema-direita e em seus diversos grupos.
Seja Harris ou Trump o próximo ocupante da Casa Branca a partir de janeiro de 2025, terá pela frente a tarefa de lidar com um país fraturado, ressentido, que carece de um projeto realístico para os novos tempos, livre das amarras dos sonhos e fantasias imperais que o dominaram desde o fim da Guerra Fria, em 1991. A roda da história gira, e os Estados Unidos e seus principais aliados ocidentais do norte global parecem, de forma temerária, insistirem em estratégias e táticas que amarram o país às crises que corroem sua capacidade de desenvolvimento e seu espírito empreendedor, que tanto encantou o planeta no auge da Revolução Industrial, no final do século 19 e início do século 20.