Belchior, nome artístico de Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes (1946-2017), foi um cantor, compositor e músico brasileiro conhecido por suas letras poéticas e introspectivas que, frequentemente, abordavam temas como amor, saudade, política e a condição humana.
Entre suas canções mais conhecidas, refletindo uma visão crítica e melancólica da realidade, estão: “Na Hora do Almoço” (1971), “Apenas um Rapaz Latino-Americano” (1976), “Alucinação” (1976), “Velha Roupa Colorida” (1976), “Sujeito de Sorte” (1976), “Como Nossos Pais” (1976) e “Medo de Avião” (1979).
É sob a inspiração da emblemática letra de “Como Nossos Pais” que este artigo pretende trazer uma possível resposta à questão: o neoliberalismo pode estar criando uma realidade mais angustiante e desalentadora do que aquela da época da canção?
A canção “Como Nossos Pais”, eternizada na voz de Elis Regina e sucesso no ano de 1976, capturou de forma sublime a angústia de uma geração que se viu repetindo os padrões de seus antecessores, mesmo que o desejo inicial fosse o de mudança. A composição revelava a frustração diante de expectativas não cumpridas e o conformismo que permeavam as relações sociais daquela época.
Na canção, a crítica à estagnação e à falta de autenticidade ecoava um desejo profundo por transformação pessoal e social, uma busca por um futuro melhor que, no entanto, parecia escorrer por entre os dedos. Para seus apreciadores, a letra da canção tratava-se de um hino, representação fiel daquela geração desalentada.
Atualmente, o neoliberalismo constitui-se como uma presença hegemônica fundamental da governança socioeconômica global. Devido à sua ênfase na desregulamentação e na redução do papel do Estado, trouxe como resultado a concentração de riqueza nas mãos de poucos, fato que tem levado a uma crescente disparidade entre ricos e pobres, perpetuando a desigualdade e gerando tensões sociais.
A privatização de serviços públicos essenciais, como saúde e educação, restringiu o acesso para aqueles que não podem pagar, ampliando, ainda mais, a desigualdade. Além disso, a desregulamentação dos mercados financeiros, uma característica chave do neoliberalismo, tem sido causa de crises financeiras devastadoras, como a de 2008.
Essas crises resultaram em desemprego massivo e austeridade governamental, afetando gravemente as economias e populações. A falta de controle sobre práticas empresariais tem causado poluição e degradação ambiental, colocando em risco o meio ambiente. Somando-se a esses fatos, o desmonte do Estado de Bem-Estar Social tem deixado segmentos vulneráveis da população sem quaisquer apoios em tempos de necessidade.
A flexibilização das leis trabalhistas, outro fundamento neoliberal, levou à precarização do trabalho, com salários baixos e más condições, exacerbando a instabilidade na geração de renda que resulta em fragmentação social e polarização política. Dentro desse ambiente socioeconômico, a concentração de poder, nas mãos de grandes corporações, erodiu os princípios democráticos, marginalizando a voz dos cidadãos comuns e comprometendo a equidade social e a estabilidade política.
Assim, sob esses entendimentos, torna-se possível responder à questão central deste artigo: sim, o neoliberalismo tem criado uma realidade mais angustiante e desalentadora do que aquela retratada na época da canção “Como Nossos Pais”.
Atualmente, o ambiente político e econômico do neoliberalismo gera desesperança de forma aguda entre os mais jovens. Essa realidade contrasta com as promessas de liberdade e prosperidade propagadas pelo neoliberalismo, fato que cria uma dissonância cognitiva que retroalimenta a angústia e o desalento.
Para reverter os efeitos deletérios do neoliberalismo, será crucial adotar políticas que promovam a justiça social e a equidade econômica. Medidas como a taxação progressiva, a redistribuição de renda e o fortalecimento das redes de segurança social podem reduzir a desigualdade e oferecer oportunidades mais equitativas. Investir em educação pública de qualidade, saúde acessível e habitação digna são passos fundamentais para garantir que todos tenham uma base sólida para prosperar, independentemente de sua origem socioeconômica.
Por meio de uma educação pública plural e inclusiva, crianças e jovens de todas as classes sociais poderão adquirir as habilidades e conhecimentos necessários para seu pleno desenvolvimento como seres humanos integrais. Além disso, estarão capacitados a contribuir para a construção de uma sociedade mais justa, equilibrada e feliz.
A oferta de sistemas de saúde acessíveis e eficientes garantirão que todos os cidadãos, independentemente de sua renda, tenham acesso a cuidados médicos preventivos e curativos. Isso promoverá uma sociedade mais saudável e produtiva, reduzindo desigualdades e melhorando a qualidade de vida.
Além disso, assegurar habitação digna implicará fornecer condições de moradia adequadas que promovam segurança, bem-estar e estabilidade. Essas condições são essenciais para o desenvolvimento pessoal, familiar e social, contribuindo para uma sociedade mais solidária e inclinada à cultura da paz.
Essas medidas, combinadas, oportunizarão a criação de um ambiente propício para o crescimento econômico sustentável e a redução das desigualdades, assegurando um futuro melhor para todos. Assim, é imperativo repactuar um modelo econômico que valorize a sustentabilidade e o bem-estar humano acima do acúmulo econômico. Incentivar práticas empresariais responsáveis e sustentáveis, regular o mercado financeiro para prevenir crises e promover políticas ambientais rigorosas são essenciais para proteger o planeta para as futuras gerações.
Finalmente, a participação democrática deve ser fortalecida, garantindo que as vozes de todos os cidadãos sejam ouvidas e consideradas nas decisões políticas. Somente por meio de um compromisso coletivo com a equidade, a sustentabilidade e a inclusão poderemos construir um futuro que não apenas evite os erros do passado, mas crie um mundo melhor e mais justo.