Tão comum quanto as candidaturas que se apresentam a cada pleito eleitoral, o tema da reeleição para cargos do Poder Executivo sempre é posto em discussão nesses momentos. A reeleição é um instituto relativamente novo, e sempre alvo de controvérsias, na política brasileira. Sua vigência permite, na prática, que um candidato detentor de mandato executivo permaneça no cargo e dispute um novo período, enfrentando outras candidaturas que, em seu desfavor, não contam com o controle do aparato estatal. Há uma disparidade brutal de condições entre quem detém o poder e quem o pretende. Isso ganha, no caso brasileiro, contornos bastante complexos pelas características do nosso sistema político.
O uso da máquina pública, de forma a atender interesses particulares ou de grupos específicos, é uma das chagas da política brasileira. A reeleição para os cargos do Poder Executivo transformou essa patologia em uma metástase. A cada eleição, há uma enxurrada de denúncias de desvios de conduta dos mais variados. Quem detém o controle do Executivo não deseja perdê-lo, o que é legítimo, desde que a disputa seja travada com um mínimo de igualdade de condições entre todos os competidores.
Interessante observar que, quando um Chefe de Poder Executivo deseja disputar mandato Legislativo, deve renunciar nove meses antes do pleito, passando o cargo a seu vice. Isso é a necessária renúncia, que evita o uso da máquina pública em favor do projeto do candidato. Não ocorre o mesmo quando ele tenta a reeleição para o mesmo cargo.
Por diversas vezes, o Congresso Nacional teve a oportunidade de alterar esse dispositivo constitucional, pondo fim à reeleição, estendendo os mandatos dos Executivos para um período de cinco ou seis anos. Mas essa discussão, por pressão do próprio mercado político, acaba sempre obstaculizada, levando à continuidade de um modelo sabidamente criador de problemas que, no limite, precisam ser resolvidos no âmbito da Justiça Eleitoral.
No período que antecede o processo de eleição deste ano, o País tem assistido ao uso da máquina pública por prefeitos candidatos à reeleição, que inauguram obras e assinam ordens de serviços em grande velocidade. Preocupa-os apenas e exclusivamente valerem-se da marca que tais materialidades podem lhes render em termos de capital eleitoral. São inúmeras as denúncias e relatos sobre obras feitas e inauguradas sem qualquer planejamento, consulta popular ou justificativa de sua real necessidade para o município. Os prefeitos, em sua maioria, fiéis ao comportamento viciado da política brasileira, governam de forma personalista, concentrando em si toda e qualquer capacidade de decisão, desprezando o planejamento e as ações de natureza estruturante para a cidade e seu desenvolvimento.
A propaganda eleitoral antecipada fica evidente, mas protegida pelos véus de uma legislação eleitoral que prevê a irregularidade como parte de um calendário físico, e não como um ato objetivo destinado a autopromoção de agente político. Alguns casos chegam a beirar o ridículo, dignos de constar em quaisquer coletâneas de histórias pitorescas e bizarras, tamanho o absurdo da burla praticada e a forma como é feita, sempre buscando driblar a lei eleitoral.
Tanto a Justiça Eleitoral, como o Ministério Público Eleitoral, se desdobram na tarefa de fazer cumprir a lei, “enxugando gelo”, sabedores da enorme dificuldade em regular ações múltiplas e concomitantes que ocorrem em um tempo curto, e de uma forma acachapante. Pouco, ou nada, podem fazer diante de um problema tão volumoso.
O instituto da reeleição, já em seu nascimento, foi influenciado pelos vícios da política brasileira, como fartamente noticiado pelas mídias à época, em especial a suspeita de recebimento irregular de dinheiro público por parlamentares para votarem a favor da aprovação da Emenda Constitucional em 1997. De lá para cá, todos os vícios relacionados a desmandos, patrimonialismo e uso indevido da máquina pública só se avolumaram e tornaram claro como aquele instituto, o da reeleição, criou um sofisticado sistema de pressão destinado a manutenção do poder político por quem já o controla.