Previsibilidade. Esta é palavra que sintetiza os resultados e a encenação do ato convocado por Jair Bolsonaro em São Paulo neste domingo, 25 de fevereiro. Com colete à prova de balas, e facadas, no seu linguajar clássico, o ex-presidente apresentou-se a uma multidão para demarcar sua capacidade de agregar as mesmas em torno de sua figura e de sua agenda política, neoconservadora e econômica; ultraneoliberal.
Mais uma vez, a extrema-direita dá mostras de sua sólida capacidade de mobilização das massas, agora, em um momento adverso. Milhares de pessoas se reuniram na avenida Paulista, dando eco ao chamamento de seu líder. O Bolsonaro que hoje discursou, antecedido pelo pastor Silas Malafaia, é um ator político acuado em razão dos inquéritos que investigam não apenas sua participação em toda uma articulação golpista, mas, também, da prática de atos tratados como criminosos pela legislação brasileira.
Discursou um Bolsonaro condenado à inelegibilidade por nove anos, até o momento, amedrontado com a evolução das investigações e seus desdobramentos. Um Bolsonaro que se mostrava feliz por poder proporcionar, ao seu chamamento, uma fotografia da avenida tomada pela multidão.
Não chegou a ser um comício, e sim um culto neopentencostal. O comando de pastores, e a fala inicial de Malafaia, deram o tom do teor político de todo o evento. Houve uma preocupação clara em estabelecer a vitimização de Bolsonaro em razão dos inquéritos aos quais responde. Ele veio à frente discursar como um ungido por Deus, uma vítima do sistema que o condenou e o investiga.
Fiel aos cânones do movimento fascista italiano, como Mussolini, acuado, discursou às massas, procurando demonstrar o apoiamento popular a si e a sua agenda, que, de forma didática, repetiu ponto a ponto. Ele traçou a estratégia para o seu campo político, com competência inegável, e esta foi capturada e será replicada a partir de agora.
Bolsonaro, indiscutivelmente, é uma liderança política que, mesmo inelegível por decisão transitada em julgado, sabe utilizar das oportunidades para, mesmo em situação de revés, vir à público instruir sobre como deve seu campo político se portar. Um discurso simples, “tosco” no entendimento de algumas pessoas, mas de uma eficiência indiscutível até para o reino mineral.
Sai da avenida Paulista ciente de sua força política e eleitoral, e soube aproveitar-se do evento para deixar isso marcado de forma profunda. O grande feito, a “fotografia “ da avenida tomada, bem ele o sabe, inundarão as redes e as mídias corporativas, manterão o evento em pauta ainda por vários dias – esta a sua grande vitória, ao lado de desenhar a estratégia da pauta política.
Não se pode, jamais, menosprezar a capacidade de mobilização da extrema-direita, que se move pela emoção, pelo sentimento de pertencer a uma grande causa. As discussões sobre a natureza dessas causas, ao fim e ao cabo, são meramente periféricas. O que importa é que ela foi reafirmada, e na presença de milhares de pessoas nas ruas, e de uma quantidade incalculável de outras pelas redes sociais.
Sim, a extrema-direita está viva, e muito atuante. O centro político, de novo, foi relegado a um papel secundário, haja visto que esse evento contribui para cristalizar ainda mais a polarização política do país. Bolsonaro, como Lula, mesmo afastados das disputas eleitorais por decisões judiciais, representam em si a própria essência do campo político que lideram de forma quase absoluta.
O país dormirá hoje sabendo que a polarização, mais que nunca, foi reafirmada com toda energia. Longe estamos do momento em que o Brasil profundo se voltará para os grandes desafios que a história lhe impõe. Ficará , por anos, este país cindido, travando os nacionais uma luta política feroz.